top of page

Este volume, traduzido e ampliado para o público brasileiro da edição original italiana de 2019, nasce da ideia de que o encontro entre pontos de vista diversos sobre a educação infantil seja, hoje mais que nunca, um valor não somente e não tanto para testemunhar a riqueza da pluralidade em si, mas para originar mudança e perspectivas renovadas, práticas educativas inovadoras das quais em nosso presente nós assinalamos a necessidade. Diante da crise econômica e social agudizada pela pandemia, mas já em curso nas nossas comunidades globalizadas, lutando com os danos de um modelo de desenvolvimento do capitalismo avançado que produz injustiças, pobreza, exclusão, e reduz a mercadoria a própria vida sobre o planeta, a educação – e em particular a educação infantil – é fortemente chamada a tomar posição. Os paradigmas e os modelos educativos nascidos no século passado, penso particularmente no ativismo e no socioconstrutivismo, que até aqui têm orientado com sucesso o desenvolvimento de uma crescente atenção educativa em direção à infância e sobretudo em direção aos primeiros anos de vida, hoje não são mais suficientes para entrar em contato e para compreender as tensões e as contradições novas e específicas do nosso presente. A vida cotidiana das crianças é marcada pela emergência sempre mais evidente de fenômenos que assinalam a pluralidade cultural em outras dimensões: nas diferenças em todas as suas manifestações sobre o plano das identidades e das escolhas éticas e valorativas, na comunicação digital e nas tecnologias que questionam a relação entre o humano, a natureza e a cultura.
A educação, livre de fechamentos ideológicos e estereotipados, deve tomar posição para estar em relação ativa com esse nosso mundo, e com as tensões e as transformações que o estão atravessando, para incidir na direção do seu desenvolvimento. Isso envolve reconhecer a inadequação das categorias educativas as quais até agora vimos fazendo referência, para iniciar a busca de novos caminhos para pensar e praticar a educação infantil. Nesse sentido, afirmar, como acontece no rastro da tradição pedagógica ocidental, que “a criança está no centro”, buscando com isso ressaltar o empenho para uma educação de qualidade, respeitosa dos direitos dos meninos e das meninas, não só não basta mais, mas talvez exige ser atualizada, para não arriscar manter viva uma imagem da infância superada na e da realidade que, na sua complexidade, não funciona segundo lógicas binárias de centro/periferia, superior/inferior, norte/sul, masculino/feminino, branco/negro, indivíduo/ grupo. Talvez deveríamos iniciar a nos colocar o problema de pensar de outro modo as relações educativas entre o mundo adulto e o mundo da infância, construindo imagens e categorias menos rígidas, antagônicas e dicotômicas, mas abertas a lógicas processuais, horizontais e plurais, capazes de captar as passagens, as simultaneidades, as reciprocidades de relações profundamente interconectadas, que não podem ser lidas e ditas em uma perspectiva hierárquica e binária. Por isso, somos impulsionados a inovar nossos paradigmas em educação, movimentando profundos processos de mudança transformativa que, para iniciarem-se, têm necessidade de confronto crítico, diálogo e troca entre experiências, culturas e práticas educativas diversas. Por essa razão é preciosa a ligação que une pesquisadores, estudiosos e profissionais da educação infantil na Itália e no Brasil, e este volume pretende colocar-se como contribuição nessa direção, com o desejo que outras iniciativas possam ser geradas e ter desenvolvimento no futuro. Esse diálogo é, a meu ver, importante e vital para poder dar vida a formas de colaboração e intercâmbio em um eixo horizontal, certamente não na lógica na presumida superioridade pedagógica de um contexto (o italiano, do norte do mundo) sobre outro (o brasileiro, em baixo, ao sul).

A crise de época que estamos vivendo nos convida a buscar novas práticas de relação mais equânimes, respeitosas e paritárias do que nos legou a experiência passada, superando a lógica da supremacia do norte sobre o sul, de uma etnia sobre a outra, do mundo adulto sobre o mundo da infância. No curso dessa perspectiva o volume oferece ao leitor um primeiro capítulo no qual o tema central é a construção de uma perspectiva crítica sobre a educação infantil.

Refletindo sobre temas e problemas educativos inerentes ao contexto italiano, obtidos graças à observação e à comparação com algumas realidades brasileiras, tomam forma de modo novo núcleos de atenção e olhares sobre a relação educativa. Isto é, nascem perguntas a partir das quais iniciar um processo de questionamento crítico de algumas pressuposições fundantes, seja da cultura educativa da infância italiana, seja relativa ao esforço de compreensão da realidade brasileira.
Os três capítulos sucessivos enfrentam por diversos ângulos o tema do papel do educador / educadora refletindo (capítulo dois) sobre as contradições, limites e possibilidades do panorama do zero a seis na Itália, sobre os processos de aprendizagem como experiências de partilha entre adultos e crianças (capítulo três) e sobre as profundas e intrínsecas conexões entre natureza, arte e ciência (capítulo quatro).
No capítulo elaborado por Flavio Santiago é desenvolvida uma reflexão sobre as diferenças como tema central nos processos educativos na creche e na escola; por fim, no capítulo de Wenceslao Oliveira o cinema é proposto como linguagem de representação dos pontos de vista infantis e como compreensão da realidade educativa.
O volume, no seu conjunto, sustenta uma ideia de educação como processo complexo em que, ainda que com papéis e poder diverso, tomam parte de modo ativo, seja o mundo adulto, seja o mundo da infância. As condições, as formas, os âmbitos, os conteúdos, bem como as regras dessas formas de participação entre adultos e infância estruturam, de modo mais ou menos explícito, a experiência educativa como fenômeno complexo, dinâmico, penetrado por contradições, fonte de perguntas e problemas para o nosso estar em pesquisa. Me agrada pensar que esse volume, cuja realização agradeço de coração a Flávio Santiago, precioso interlocutor crítico, e a Pedro & João Editores, por haver acreditado imediatamente com confiança no projeto, possa ser o início de um longo e amplo diálogo paritário, de troca crítica e dialética entre profissionais da educação entre Brasil e Itália, no qual todos e todas nós temos o que aprende.

As crianças também aprendem: o papel educativo das pessoas adultas na educação

R$ 50,00Preço

Agnese Infantino [Org.]
As crianças também aprendem: o papel educativo das pessoas adultas na
educação infantil. São Carlos: Pedro & João Editores, 2022. 249p. 14 x 21 cm.
ISBN: 978-65-5869-777-0 [Impresso]
1. Educação infantil. 2. Pedagogia da infância. 3. Contextos educativos. 4.
Aprendizagem. I. Título.

bottom of page